quarta-feira, 10 de junho de 2009

"Mas se eu gritasse uma só vez que fosse, talvez nunca mais pudesse parar. Se eu gritasse ninguém poderia fazer mais nada por mim; enqunato se eu nunca revelar a minha carência, ninguém se assustará comigo e me ajudarão sem saber; mas só enquant eu não assustar ninguém por ter saído dos regulamentos. Mas se souberem, assustam-se, nós que guardamos o grito em segredo inviolável. Se eu der o grito de alarme de estar viva, em mudez e dureza me arrastarão pois arrastam os que saem para fora do mundo possível, o ser excepcional é arrastado, o ser gritante.
Olhei para o teto com olhos pesados. Tudo se resumia ferrozmente em nunca dar um primeiro grito - um primeiro grito desencadeia todos os outros, o primeiro grito ao nascer desencadeia uma vida, se eu gritasse acordaria milhares de seres gritantes que iniciaram pelos telhados um coro de gritos e horror. Se eu gritasse desencadearia a existência - a existência de quê? A existência do mundo. Com reverência eu temia a existência do mundo para mim."

Lispector - A Paixão Segundo G. H.

Um comentário:

sabina anzuategui disse...

li esse livro faz uns cinco anos, e não lembrava desse trecho.
é lindo.